WW2 - 2 pérolas do cinema soviético

O que eu conhecia de cinema russo até anteontem resumia-se a 2 filmes de Sergei Eisenstein (O Couraçado de Potemkin (Bronenosets Potyomkin, 1925) e Aleksander Nevski (Aleksandr Nevskiy, 1941)) e a 4 filmes de Andrei Trakovskiy (A Infância de Ivan (Ivanovo detstvo, 1961), Andrei Rublev (Andrey Rublyov, 1966), Solaris (Solyaris, 1972) e O Sacrifício (Offret, 1986)), os dois cineastas russos mais importantes de sempre.
Vi recentemente 2 novos filmes russos, feitos com apenas 2 anos de diferença cuja acção decorre durante a 2ª Guerra Mundial, e a genialidade de ambos fez-me esquecer, por momentos, os “gigantes” que eu conhecia.

Em 1957, Quando Passam as Cegonhas (Letyat Zhuravli) vencia a Palma de Ouro em Cannes. A história de um Amor que a guerra interrompe é o tema central de um filme que consegue a difícil tarefa de alcançar o equilíbrio entre o Concreto e o Artístico. Contado num estilo muito directo, este filme podia cair na armadilha de se tornar numa obra menor, mas a profundidade que gradualmente nos vai sendo dada a conhecer da natureza humana das personagens faz desta película um crescendo de complexidade, grandiosidade e satisfação.
A engenhosa utilização da música e uma filmagem que me surpreendeu (para a época e para o país) no que respeita ao movimento, aos ângulos e aos grandes planos, conferem um cunho artístico a uma obra que só consigo classificar como “épica” (sem o ser na aparência).


Dois anos depois, A Balada do Soldado (Ballada o Soldate, 1959) vencia o BAFTA para Melhor Filme Estrangeiro. Sendo assumidamente um filme de propaganda soviética, A Balada do Soldado não deixa de ser um filme magnífico. Mais ainda do que em Quando Passam as Cegonhas, o enredo de A Balada do Soldado é linear, puro, demasiado explícito e quase inocente. Tal como o personagem principal, o soldado Alyosha que, nos 6 dias de licença que lhe são concedidos mostra toda a bravura do soldado russo. Porque este filme é isso mesmo: a glorificação do Soldado Russo.
Em A Balada do Soldado, os personagens são simples, honestos e é essa positividade da natureza humana que nos é mostrada que contrasta com o horror de uma guerra que acontece ali tão perto… nos mesmos lugares onde se movem os puros. Em Quando Passam as Cegonhas, pelo contrário, é o lado mais negro do ser humano que é posto a nu: ninguém sai ileso numa cadeia de acontecimentos que teima em mostrar o paralelismo entre o horror da guerra e fragilidade do ser humano. Contudo, no final é o Bem quem sai vencedor.

Em ambos os filmes, a espera pelo Amor que virá ou não após a guerra é “O” Tema. A mulher sofredora que acolhe o soldado que regressa estropiado, a mulher que engana o marido que chora por ela na frente, a mulher que volta a casar sem nunca esquecer quem é dado como desaparecido ou a mulher que espera por um homem que mal conheceu mas por quem se apaixonou. A dureza é-nos mostrada não só do lado dos que lutam na frente mas também dos (ou melhor: “das”) que lutam na rectaguarda, as quais, ao mesmo tempo que participam no esforço de guerra (algo já mostrado por William Wyler em Mrs. Miniver (Mrs. Miniver, 1942) ou John Cromwell em Desde Que Tu Partiste (Since You Went Away, 1944)), vivem no marasmo de uma vida em suspenso devido a uma guerra que, temporariamente ou não, lhes destruiu a família.
Com estes 2 filmes, o Cinema Russo surpreendeu-me muito positivamente.

Comentários