Apenas ser

“Nenhum homem é uma ilha isolada; cada homem é uma partícula do continente, uma parte da terra; se um torrão é arrastado para o mar, a Europa fica diminuída, como se fosse um promontório, como se fosse a casa dos teus amigos ou a tua própria; a morte de qualquer homem diminui-me, porque sou parte do género humano. E por isso não perguntes por quem os sinos dobram; eles dobram por ti.”

John Donne

Foi com este poema de John Donne que Hemingway iniciou o seu romance mais conceituado (mas não o melhor): Por Quem os Sinos Dobram.
Li esta frase pela primeira vez quando li o livro, tinha uns 20 anos. Uns (poucos) anos mais tarde, ouvi-a numa conferência da Lídia Jorge, como uma das máximas da sua vida.
Sinto-a, reflexo do que sou… melhor: imagem do que sou… melhor ainda: o que sou.
Sinto por vezes carregar o peso da humanidade, e essa condição encosta-me à vida. Porque, se mesmo o que não me deveria afectar me afecta, também o que não me deveria alegrar me alegra. Só ou acompanhado, o prazer ou desilusão extraído do que acontece à minha volta, ou do que me acontece a mim, é uma realidade.
Dar e receber é uma constante da vida.

"And, in the end, the love you take
Is equal to the love you make”

Paul McCartney

Na penúltima música do último álbum dos Beatles (Abbey Road), The End, a frase final é bonita. O resto… é praticamente instrumental.
Cada um dos 4 elementos tem um solo nesta canção, embora chamar canção a The End seja abusivo: ela faz parte de uma rapsódia que compõe toda a segunda parte do álbum, perdendo sentido desliga-la do resto das músicas.
Contudo, se há músicas que sobressaem nesta rapsódia, outras há que “vão na corrente”. The End conjuga estas duas tendências: se a primeira parte desta (curta) música se limita a ser a sequência do que lhe antecede, a segunda parte é a beleza que realça a força da frase aqui escrita.

Se é verdade que, para alguns, (quase) tudo nos afecta, tenho dúvidas de que a vida seja um jogo de soma nula (a acreditar por The End). Se o que damos é igual ao que recebemos, não sei. Apenas sei que, por muito que, por vezes, não queira, nada me é indiferente

Nenhum Homem é uma Ilha Isolada foi uma abertura de génio.
The End foi um fecho com chave de ouro.

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