1939 - O ano de ouro

Quando se fala da história do cinema, a época de ouro do cinema vem muitas vezes (ou sempre) para primeiro plano. Ultrapassando a subjectividade que acompanha sempre uma opinião, por mais próxima da unanimidade que ela possa estar, os anos de ouro do cinema encontram-se bem lá atrás no tempo. O período entre o final dos anos 30 e meados da década de 50 (mais ou menos) incorpora essa denominação. Não que não exista cinema de qualidade na actualidade, longe disso (este ano é disso exemplo, quando a história permitir alcançar o distanciamento suficiente), mas comparando a pobreza quantitativa que foram as últimas duas décadas, pontuadas por uma ou outra obra superior (quando comparada com o periodo anterior), não é difícil reconhecer a riqueza do passado, sem qualquer saudosismo nem nostalgia. Apenas factos.
Indo um pouco mais longe, pode falar-se de um ano melhor do que todos os outros?
Absolutamente.
Numa altura em que o cinema se estava a desenvolver de ano para ano (a todos os níveis), quer no que respeita aos avanços técnicos (stop motion, widescreen, technicolor, …), quer no que tocava ao formato dos contratos celebrados com as estrelas (muitas eram autênticas propriedades dos estúdios) quer ainda no que respeitava a execução dos filmes propriamente ditos (técnicas de filmagem, ousadia nos argumentos (elevando alguns guiões e verdadeiros marcos contra a censura),…), 1939 foi o ano que congregou uma quantidade e qualidade superior a qualquer outro ano anterior ou mesmo posterior.
É maioritariamente considerado como o melhor ano de produção cinematográfica em Hollywood.

Embora se torne obrigatório referir as obras responsáveis por esta distinção, mais do que as palavras, é a sua visualização que melhor pode explicitar este juízo. Assim, uma ou duas linhas para cada uma é mais do que suficiente para relembrar a qualidade que têm e poder, eventualmente. despertar a curiosidade de quem não as viu.
Dos 6 filmes seguintes, vi 4. Para não cair na tentação de elogiar um filme de que possa vir a não gostar, dos 2 que não vi referirei apenas os nomes (de um deles falarei do enredo, uma vez que li o livro).

E Tudo o Vento Levou (Gone With The Wind) - Não sei se será necessária apresentação para falar do primeiro blockbuster de sempre… filmado originalmente a cores, E Tudo o Vento Levou era já um sucesso antes ainda de ter estreado. A busca da actriz para interpretar o papel de Scarlett O’Hara, a compra dos direitos do celebérrimo romance de Margaret Mitchel, a rotatividade dos realizadores (houve 3, tendo finalmente sido atribuído a Victor Fleming o crédito final), todas as histórias das filmagens, o (considerável) número de óscares que venceu e, claro, a qualidade do filme… tudo contribuiu para transformar E Tudo o Vento Levou num dosd maiores clássicos da 7ª Arte.

O Monte dos Vendavais (Wuthering Heights), que não vi (ainda), foi a primeira adaptação do romance homónimo de Emily Bronte, e revelou ao público americano o grande Laurence Olivier.

Peço a Palavra (Mr. Smith Goes To Washington) – Do cinema de Frank Capra pode esperar-se tudo, mas a sátira/comédia terá sido, talvez, o género em que mais trabalhou. Depois de Um Doido Com Juízo (Mr. Deeds Goes to Town), Capra volta ao tema do comportamento do homem ingénuo no meio corrompido da “gente evoluída”, no filme de confirmação de James Stewart (no ano anteiror havia participado em Não o Levarás Contigo (You Can’t Take It With You), também de Capra). Peço a Palavra é hoje um dos clássicos que melhor reflectem o inocente mas sincero olhar americano (no sentido em que qualquer um pode mudar o mundo) bem como, em menor escala, o desenvolvimento do self-made men.

Adeus Mr. Chips (Goodbye Mr. Chips) – O livro de James Hilton (autor de uma outra obra-prima chamada Horizonte Perdido) é uma ternura; as memórias de um professor de liceu, apresentadas retrospectivamente ora na 3ª pessoa, ora pelo próprio é uma das melhores homenagens à profissão docente que li. Toda a vida de Mr. Chips é condensada em apenas 80 páginas, mas é uma vida tão cheia e tão bem contada que mal me dei conta de que, ao final da tarde, o livro estava lido. Tenho grande curiosidade em ver a interpretação de Robert Donat, tanto pela personagem fascinante que é Mr. Chips, como pelo facto de ter “usurpado” o Óscar a colossos como Clark Gable, Laurence Olivier ou James Stewart.

Ele e Ela (Love Affair) – Leo McCarey deve ser dos poucos realizadores que fez um remake que se tornou mais célebre do que a versão original. Em 1957, O Grande Amor da Minha Vida (An Affair To Remember) entrava para a história dos filmes românticos, muito devido par formado por Cary Grant e Deborah Kerr. No entanto, 18 anos antes, McCarey havia filmado este Ele e Ela (nomeado para 6 Óscares). Irene Dunne e Charles Boyer formam o casal que se conhece num paquete e combinam… (basta ver o post sobre O Grande Amor da Minha Vida – a história é parecida).

A Regra do Jogo (La Règle du Jeu) – Jean Renoir é um dos grandes nomes do Cinema Francês. Este A Regra do Jogo é dos poucos filmes que vi dele… e é uma pérola. Como também já escrevi sobre este filme não há muito tempo, não tenho muito mais a acrescentar, excepto referir que, dos 4 filmes que vi deste conjunto (de 6), este é, de longe, aquele de que mais gostei. Por tudo o que disse então, e por Renoir ter sabido tão bem segurar as pontas desta tragi-comédia e elevá-la a obra de culto.

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