Na noite provincial da varanda de onde escuto os ladrares distantes e os murmúrios dos últimos grilos de um Verão tardio, contemplo os candeeiros de um céu estrelado que nunca se acendem na cidade onde habito.
E penso… na vida… na atitude perante a vida… no modo como tem sido vivida… e apesar do já meu conhecido aperto no peito, com que engulo em seco e sustenho a água na ausência do olhar, sinto o prazer da calma para pensar, para escrever, talvez reinventar algo.
Olho para o lado: a geometria das varandas geminadas na noite são camarotes assistindo ao recital orquestrado de cães e grilos, sob a cúpula prateada de um céu que cintila tão perto do meu pensamento, ofuscado aqui e ali pelo frio espelhado dos parcos exemplares da iluminação pública plantados à beira do pinhal.
Amanhã, provavelmente, tudo estará diferente, para melhor ou para pior não sei, aprendo a viver cada dia, mais uma vez.
Vejo a Ursa Maior à minha frente vigiando os últimos baldios, embaixadores de outros tempos e lembro-me do que nunca cheguei a viver.
Vagamente, julgo ter começado algo importante, mas mais uma vez, foi um início demasiado longo para se ter deixado viver.
São apenas dez da noite e sei que daqui a pouco, após sentir uma última vez a frescura nocturna da melancolia, irei para dentro. Ler? Tocar? Dormir? Ver um filme?
Se estas palavras são vagas, tristes, aborrecidas até, fazem parte de um caminho, contraponto do que está para vir, ponto de apoio para uma forma diferente de encarar o futuro, espero.
Camarnal, Marinha Grande, 14-09-2012
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