A ideia peregrina no Chipre


Que o bom senso tenha fugido, não sei bem para onde, embora me preocupe, não me surpreende. Mas quando começo a acreditar piamente de que a inteligência o acompanhou, então a preocupação ganha uma forma muito mais “corpórea”. Não sei se a inteligência fugiu ou se nunca existiu e foi apenas uma miragem durante estes anos.
Refiro-me à aprovação, pelo Eurogrupo, da lei peregrina que pretendem implementar no Chipre, de taxar em 10% os depósitos superiores a 100.000 euros e em 6,7% os restantes depósitos bancários.

Alguém, no seu prefeito juízo acreditava que uma alarvidade deste calibre não iria provocar uma corrida aos depósitos e o pânico no país (vamos ver o que acontecerá no resto da Europa)?!
Não sei que benefícios o Chipre oferece aos seus depositantes (sei apenas que tem condições vantajosas), mas creio que estas deverão ser mais a um nível fiscal do que sobre a taxa efectivamente oferecida: a Euribor é uma média de taxas de empréstimo interbancárias entre 20 bancos da zona Euro, por isso não sei que liberdade terá um banco da zona Euro, ainda para mais periférico, para praticar uma taxa, digamos, de 6% a um ano. Mas admitamos que o faz, e qua a taxa liberatória no Chipre é de 0%, isto é, o Estado não leva um cêntimo dos juros dos depósitos do país (é o Paraíso na Terra). Mesmo assim, com a aberração de inteligência que é esta lei, compensa a um cipriota (ou um magnata russo ou um reformado inglês com dinheiro na ilha) colocar o dinheiro debaixo do colchão: deixa de ganhar 6% mas deixa de perder 6,7%!

Não basta andar de fato e gravata cara, falar sueco, alemão ou francês, ou viver em Bruxelas ou Estrasburgo para se ser inteligente: esta gente, com a aprovação desta lei, deixou de conseguir disfarçar muita coisa: o pânico em que estão; os broncos que são; o culto da imagem sobre a substância e as suas reais intenções.
Nós, portugueses, que tantas vezes olhamos para os estrangeiros, sobretudo os nórdicos, com subserviência, temos aqui uma prova, caso fosse necessária, que são tão patos bravos como qualquer um de nós.
Pior: isto foi aprovado pelos membros do Eurogrupo, onde estão os ministros das finanças da Europa, os “mandões” mas também os intervencionados! Que solidariedade europeia esta!
E nem o facto de, cobardemente, ponderarem arrepiar caminho e manter a medida apenas para os depósitos superiores a 100.000 euros, lhes lava as mãos: só as suja mais ainda pois trata-se de emendar um erro com outro ainda maior. Diferenciar desta forma quem tem mais de quem tem menos (e não sabemos porque é que quem tem mais o tem: pode simplesmente ter poupado mais) é perigoso. A diferenciação na contribuição fiscal entre quem tem e quem não tem é feita sobre o rendimento. Se para além disso, tudo o resto é escalonado, pode chegar-se ao limite absurdo de compensar ter menos.
Por exemplo, no caso extremo de 2 depositantes, um com 100.001 euros e outro com 99.999 euros, depois da aplicada a taxa peregrina, o primeiro ficaria com 90.000,90 euros e o segundo com 93.299,07.
Jesus Cristo ou Robin dos Bosques não fariam melhor!

Por fim, na forma, esta lei foi uma “filha da putice”: fechar os bancos para que a lei possa ser aprovada e não dar às pessoas a possibilidade de protegerem o que é seu (antes da lai ser aprovada 100% do capital é delas). É roubo na forma e na substância.
A Europa está a virar fascista, sem o menor atenuante para a força e malvadez que esta palavra traz consigo. Porque aprovar leis e tomar decisões porque “quero, posso e mando” sem referendo ou, no mínimo uma negociação é, pura e simplesmente, fascismo.
É triste constatar que não aprendemos nada com a história: nem com a corrida aos bancos nos Estados Unidos em 1929, nem com a humilhação inlfingida à Alemanha no pós 1ª Guerra Mundial (compare-se com o que estão a fazer à Grécia e agora ao Chipre) nem com os laivos ditatoriais do poder económico no pré 2ª Guerra Mundial, nem com as ditaduras absolutas (com medidas por decreto, deste género) por trás da “cortina de ferro”. Aproximamo-nos de ter 4 em 1, ie, tudo isto em simultâneo.

A conversa do ser humano, superior, possuidor de inteligência, capacidade para reflectir, etc… isto vem mostrar que muitos “da nossa espécie” estão num estado mais bruto do que muitos animais irracionais. Mesmo que seja a ganância ou a “real politik” a movê-los, o facto de terem tomado esta medida de uma forma tão infantilmente descarada desarma qualquer resquício de inteligência que pudessem ter tido.

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