“Perder” tempo para dizer mal de um filme nem sempre é um desperdício: trata-se do produto de alguma reflexão.
A Essência do Amor (To The Wonder, 2012), a nova obra de Terrence Malick é um teste à paciência do espectador “médio”. Mais: é um teste à paciência do espectador amante de cinema.
Nem todos temos que gostar de tudo. Nem todos temos que gostar de um artista porque ele é diferente, porque é respeitado num ou noutro meio mais elitista ou artístico, porque ele é um outsider com toda a simpatia que isso por vezes nos causa ou porque o que fez antes nos disse algo especial.
Sou um fã incondicional de A Árvore da Vida (The Tree of Life, 2011) e se, na altura, mostrei porquê, não me lembro de ter referido o doseamento, na minha opinião, perfeito, entre diferentes aspectos, quer técnicos quer de conteúdo: a estética, a banda sonora, os diálogos, as “frases soltas” como forma de reflectirem os pensamentos ou estados de espírito mais íntimos das personagens, o feito, muito bem conseguido de abarcar os mais diversos aspectos da existência, e a sequência (tantas vezes criticada) da formação do Universo como a resposta de Deus a uma dúvida perturbadora.
A Essência do Amor possui o demérito de, ao exagerar de tal forma em alguns destes aspectos, não se conseguir reinventar chegando a ser, em variados períodos, tão igual a A Árvore da Vida, que se torna num filme difícil para quem esperava muito mais de um realizador que em 30 anos havia feito apenas 5 filmes: ter feito 2 filmes em 2 anos consecutivos não deu bom resultado.
A “voz-pensamento” que em A Árvore de Vida é o complemento perfeito para exprimir as inquietações existenciais de Mrs. O’Brien, é a voz principal em A Essência do Amor (os diálogos são praticamente inexistentes). Se tal acontecesse numa história com um conteúdo sólido, até poderia resultar, mas o tema do Amor, da entrega, da traição e da infidelidade, tratado só com imagens deixa muito pouca substância para ser reflectida nestas frases soltas… como que perdidas no meio de um conjunto de imagens fantásticas (nisto Malick continua sublime)… perdidas como os personagens, algo que também foi muito bem conseguido neste filme: um triângulo amoroso onde todos, de alguma forma, se perdem no enredo da sua existência. Resta o padre, que também anda perdido mas que, claramente, não pertence a esta história.
E se Malick tem já alguns outros projectos em pré ou pós-produção, temo que esta sofreguidão com que agora desatou a filmar, como se não houvesse amanhã, cause algum dano à sua obra, até aqui tida como respeitável. Os períodos de reflexão com que intervalava os seus filmes variaram entre os 6 e os 20 anos, e tal mostrou ser proveitoso. Cada um dos seus 5 filmes anteriores são obras que, embora possuam a grandeza da estética e reflexiva sobre as questões mais profundas da Natureza, têm um cunho único, de se reinventarem e de possuírem uma autenticidade pessoal e, simultaneamente, universal.
A Essência do Amor perdeu esta magia do cinema de Malick. Talvez Malick esteja a entrar numa fase da vida em que nada de novo tem para inventar, talvez tenha tombado (finalmente) perante Hollywood e sentido a pressão para fazer filmes com uma frequência mais ”normal” ou talvez isto tenha sido um acidente de percurso… veremos.
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