Para primeiro romance (não
primeira obra de ficção – ele já havia publicado um livro de contos anos
antes), constituiu uma surpresa muito agradável (e tenho tido muitas nos últimos
tempos – pode querer dizer que estou a saber escolher melhor). Foi surpresa na
medida em que se veio a revelar diferente do que eu esperava, mas não no que
respeita à qualidade: o livro vinha rotulado com alguns pesos pesados dos prémios
literários: este romance de 2007 recebeu no ano seguinte o National Book Critics Circle Award
e o Prémio Pulitzer para ficção.
A Breve e Assombrosa Vida de Oscar
Wao conta a história de um miúdo que se faz rapaz, e que concentra nele todos
os medos, traumas e esquizofrenias da adolescência, e que condicional de uma
forma doentia a sua “breve” vida.
É também a história da sua família,
oriunda da República Dominicana, “filhos” e “netos” de Trujillo, o louco
todo-poderoso cuja ditadura marcaria as suas vidas de uma forma indelével,
confundindo-se com o fukú, a maldição das Caraíbas, que tomou conta das três
gerações desta família para não mais a abandonar.
Pertencentes à “Diáspora”, a
geração que emigrou para os Estados Unidos em busca de uma oportunidade e
fugindo ao regime de terror, os elementos de Realismo Mágico confundem-se com
as grandes narrativas norte-americanas: o sul e o norte da América literária
estão muitíssimo bem concentrados e balanceados neste romance e é também por
isso que ele é único.
Mais “Realismo” do que “Mágico”
aproxima o romance sul-americano do norte. A narrativa épica da história de uma
família contada a “100 à hora” aproxima o romance norte-americano do sul.
E com isto Junot Díaz, um
dominicano que não tem pejo em pessoalizar para além do razoável a obra com factos
e opiniões (o gajo é professor no MIT, ó Chico) constrói uma obra extraordinária.
As suas longas, acutilantes e
arrojadas notas de rodapé, que deveriam chamar-se, em abono da verdade, “notas
de página” tal a sua extensão (uma delas tem uma página inteira!) vão
conferindo à história uma dimensão verdadeiramente épica, contando a vida do país,
de Rafael Leonidas Trujillo, “El Jefe”, dos seus episódios mais marcantes, dos
seus apoiantes mais próximos e dos seus mais acérrimos opositores, da “Diáspora”,
etc… a vergonha que Díaz não tem em qualificar Trujillo de filho da puta numa
nota de rodapé que esperamos sempre neutra e algo salobra apimenta e
complementa muito bem o romance.
A estrutura está de acordo com a
velocidade a que os acontecimentos se desenrolam nas páginas à nossa frente: ora
estamos nos anos 80, depois recuamos uma geração para 60, voltamos a 70,
recuamos à década de 40 para a primeira, … e tudo para mostrar que o nosso
destino é uma mescla altamente desequilibrada entre o que somos genuinamente e
aquilo que são aqueles que nos fizeram, que nem sempre é fácil fugirmos a gerações
com um destino marcado, por muito que queiramos acreditar que controlamos a
nossa vida.
É essa a perspectiva que perpassa destas páginas. E mesmo não
concordando (obviamente), ver uma história tão bem contada e tão rica faz-me
abandonar quaisquer “pré-conceitos” para entrar numa grande obra de ficção.
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