Meredith Baxter - Uma Vida

Vi ontem na Oprah alguém que não via há anos. Isto não é bem verdade: revi-a na RTP Memória, amiúde aos fins-de-semana há meses atrás, mas, com regularidade, não a via há anos… desde os anos da minha adolescência.
Falo de Meredith Baxter. Era conhecida pelo nome de casada, na altura de maior sucesso da sua carreira: Meredith Baxter Birney. Representou durante 7 temporadas o papel de Elyse Keaton, a mãe de família na comédia de sucesso da NBC dos anos 80 Quem Sai Aos Seus.

Fiquei surpreendido com a história da sua vida: após um casamento infernal que terminou em divórcio e que contribuiu para o seu vício com o álcool, Meredith Baxter assumiu posteriormente a sua homossexualidade.
A mãe de família perfeita da TV tinha, na verdade, uma vida bem triste.
Mas mais do que a vida que levou, surpreendeu-me a sua coragem e a reacção dos que a rodeavam (sobretudo os filhos).

Constatar o apoio dos filhos a uma separação ou a sua compreensão na assunção da homossexualidade ou ainda a amizade do seu “marido” na série Steven Keaton (o actor Michael Gross) é algo que é muito mais possível nos dias de hoje, mas que, há 20 anos, deveria ter sido muito mais difícil.
Senti-me identificado com a época em que vivo, em pertencer a um tempo em que estes assuntos começam a ser abordados com a normalidade que sempre deveriam ter tido.
Creio que cada vez menos a vivência e a convivência com estes assuntos é confundida com falta de valores. Contudo, há ainda resistências que, de tão desconhecedoras que são da realidade, caiem no ridículo da hipocrisia (correndo o risco de um dia essa realidade que tanto abominam lhes cair em cima)
Woody Allen, no seu último filme, Meia-Noite em Paris, explora, ainda que muito levemente, um tema que já me tinha passado pela cabeça: achamos muitas vezes que a idade de ouro está no passado. Os valores de hoje pouco valem quando comparados com os de antigamente, numa qualquer época ou período por nós eleito como “ideal”.
Se, algum dia, tivéssemos a possibilidade real de lá nos deslocarmos, estou convencido de que constataríamos que esse período não seria assim tão dourado. Apenas a nossa ilusão nos leva a acreditar no contrário, o conhecimento que julgamos ter de algo que não conhecemos, de facto.
Este apego à tradição é um entrave enorme ao espírito livre, mas, felizmente, vai sendo paulatinamente substituído por um olhar menos inquisidor e, por isso mesmo, mais saudável, da realidade que nos rodeia, e que é como é.
Cair no extremo contrário é também um erro (como todos os extremismos): assumir que tudo o que vem do “antigamente” é mau, antiquado, desajustado, … é, por si só, desprovido de sentido. O passado é importante demais para ser visto como o Inferno ou como o Paraíso. O passado existe para que com ele possamos aprender. Aproveitar o que é bom e alterar o que é mau.
Einstein dizia que “A tradição é a personalidade dos imbecis". Não vou tão longe, porque considero que algumas tradições são muito importantes e “inocentemente divertidas”. Mas creio perceber o que quis dizer: justificar algo com o argumento da tradição está ao nível de um mentecapto… é como alguém responder: “Porque sim”.
Quando assim é, está tudo dito.

Por muito que tentemos escamotear preconceitos com argumentos de toda a índole, acima de tudo está a felicidade e, se bem que, por vezes, seja difícil alcança-la, tal não significa abdicar dela.
Elyse Keaton (para mim será sempre assim que a conhecerei) venceu na vida. Com o apoio daqueles de quem vale a pena ter o apoio. Daqueles que lhe são queridos e que a querem bem.
É hoje mais feliz, e isso não tem preço.
Não alcançou a felicidade a qualquer preço. Pelo contrário, pagou um preço elevado. Mas teve coragem. Uma coragem enorme.

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