A defesa de "Meu Pé de Laranja Lima"

A lembrança de uma afirmação que alguém fez há meses visitou-me hoje:

“Uma amiga minha tinha um namorado cujo livro preferido era «Meu Pé de Laranja Lima». Ela disse que assim que soube disso terminou logo o namoro com ele: homem que é homem não tem como livro preferido uma obra como «Meu Pé de Laranja Lima»”

A frase era mais ou menos esta.

“Meu Pé de Laranja Lima”, de José Mauro de Vasconcelos, não é o meu livro preferido, mas está no top… bem no top. Devo confessar que considero um bocadinho exagerado terminar um namoro por causa disso. O livro é lamechas, é verdade, mas não é propriamente um “livro de gaja”. É até uma história bem bonita. Ao contrário dos filmes, consigo identificar bem os meus livros preferidos. E algo que me dá gozo é reler um livro de que gostei. Como os restantes livros que estão no topo da lista, já reli “Meu Pé de Laranja Lima”, uma ou mesmo duas vezes (aquela “gaja de bigode” já teria acabado comigo 2 ou 3 vezes).
Este livro conta "simplesmente" a história de um miúdo de 6 anos, pobre, que deambula entre o abandono e a violência da família, entre a busca incessante da ternura que não encontra nos seus e a necessidade de fazer as travessuras que todos os miúdos deveriam fazer, entre compreensão com que presenteia a sua professora e a incompreensão com que a pobreza o magoa, entre a descoberta da verdadeira Amizade e a descoberta da verdadeira Dor… sem uma não haveria a outra.
Juntamente com o meu livro favorito (“Por Favor, Não Matem a Cotovia”, de Harper Lee), este é o melhor livro, dos que li, que descreve o mundo da infância. Ambos são autobiográficos. Talvez por isso a autenticidade confira a estas duas histórias tanta inocência, tanta genuinidade, tanta verdade, tanta ternura…
Há algum tempo que penso relê-lo… talvez a lembrança da frase proferida por “aquela homem” tenha despertado em mim novamente a vontade de reler um dos livros que mais me marcou. Livro que, ao contrário do que está no plano nacional de leitura, não o considero para crianças, mas sim para adultos… quer pela tristeza por vezes demasiado presente, quer para estes se lembrarem (eu incluído), ainda que por breves momentos, daquilo que em tempos foram.

Nunca vi a telenovela, nem quero. Porque este é daqueles livros cujo espaço para a imaginação é um dos pontos fortes. Imaginação de tudo… situações, cenários, expressões, … ao contrário de “Por Favor, Não Matem a Cotovia”, cuja versão cinematográfica, “Na Sombra e No Silêncio“ (To Kill a Mockingbird, 1962), valoriza (ainda) mais o livro.

Fico-me por aqui: apenas quero agradecer à amiga do meu director a frase inspirada… foi ela que despoletou esta pequena reflexão bem como a minha mais que provável próxima leitura. E já agora, deixa-me dizer-te uma coisa: “Saiu a sorte grande ao teu namorado! Safou-se de «boa».”

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