Victor Erice - desconhecido entre nós

Continuando a descobrir o fantástico Cinema Espanhol...


Em Janeiro passado, vi na Cinemateca um filme que me surpreendeu… decidi ir vê-lo apenas com base na classificação IMDB (8,2): nem sinopse, nem intérpretes, nem realizador, … não conhecia nada deste filme.
Ao ler a folha com a ficha e a crítica, a minha curiosidade aumentou: o crítico desfez-se em elogios a Victor Erice (o realizador), não apenas a respeito deste filme, mas também do filme anterior (e primeiro): O Espírito da Colmeia (El Espiritu de la Colmena, 1973). Falava que a expectativa era grande aquando da saída de O Sul (El Sur, 1982), uma vez que Erice havia estado 9 anos sem filmar, a fasquia era elevada e O Sul era uma obra inacabada (devido a questões orçamentais, o filme termina com a partida da personagem principal para o Sul, ficando o espectador em suspenso sobre o fascínio que este local teria exercido não no imaginário, mas na vivência da pequena Estrella).
Gostei do filme, mas não foi amor à primeira vista: o prazer de apreciar uma obra cujo pensamento complementar me foi dizendo muito mais do que o primeiro impacto tem sido grande, e culminou com a vontade de ver as outras duas longas-metragens de Victor Erice: O Espírito da Colmeia e O Sonho da Luz, O Sol do Marmeleiro (El Sol del Membrillo, 1992).
Se o primeiro revelou ser mais uma obra-prima, o segundo custou-me a engolir.
A melancolia sublime desenvolvida em O Sul teve a sua origem em O Espírito da Colmeia. Ambas as histórias são contadas do ponto de vista de uma criança (no primeiro filme, Ana Torrent, numa magnífica estreia aos 7 anos, e no segundo, Sonsoles Aranguren e mais tarde Icíar Bollaín) e tal transmite maravilhosamente os sonhos, ansiedades, a inocência, o medo e a alegria que dão corpo ao modo como uma criança vê o mundo, sem a corrupção do preconceito ou a noção bipartida do Bem e do Mal como adquirida pela gente crescida.
Sublime é também a realização de Erice, sem a qual estes dois filmes pouco valeriam: ambos contêm imagens belíssimas, que acompanham o ritmo lento da tristeza que as histórias vão transmitindo.
O Sonho da Luz, O Sol do Marmeleiro não chega a ser uma obra de ficção mas também não é exactamente um documentário: fica-se pela transmissão de uma ideia. E se completa o tríptico de Erice no sentido em que os 3 filmes constituem exemplos maravilhosos da fusão das diferentes Artes em Cinema, é “demasiado artístico” para o meu gosto. Conta a história da feitura de um quadro pelo pintor espanhol António Lopez Garcia, que pretende pintar um marmeleiro quando o sol de Outono incide sobra a árvore de um determinado ângulo, de modo a que a luz crie o efeito ideal para a construção da imagem que ele pretende. Mas tal efeito não dura mais de 2 horas do dia, e os planos começam a sair frustrados quando a chuva começa a boicotar o processo criador. Interessante, mas demasiado “incaracterístico” para o meu gosto.

Tal não belisca a opinião que formei de Victor Erice: é um génio. Pela qualidade das suas obras, por realizar o que quer quando quer (3 filmes em 20 anos), pela sensibilidade que consegue transmitir, prolongando o impacto da sua obra no espectador muito depois dos créditos finais desaparecerem, e por ter tido o mérito de ver um filme inacabado, O Sul, ser eleito o 6º melhor filme Espanhol dos primeiros 100 anos do Cinema Espanhol.

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