Tríptico de umas férias no Sul

A Praia

A praia sem tempo, um mergulho na água gelada, daquela que enrijece os ossos e paralisa os membros, e secar ao sol, Galé Oeste.

O segredo das férias é o tempo, ou a sua ausência, e o sol e a areia que cansam sem esgotar, a parafernália de equipamento – toalhas, chapéu, comida, livros, água, almofadas, e outra bolsa para a carteira, telemóvel, etc… – a que nos habituamos para ali estar durante aquelas duas ou quatro horas, normalmente pela manhã, em Setembro, quando a escola ameaça abrir e o areal fica disponível para nós, sem carros nem filas.

Chegamos, espalhamos o creme e caminhamos, o estojo com a carteira e o telemóvel na mão para não desperdiçar os passos valiosos que o aparelho regista. Caminhamos sobre o tapete de água deslizante que nos beija os pés refrescando-nos sob o sol crescente, e regressamos para logo efectivarmos o mergulho, um ou dois que não chega a ser banho com a água gélida, demorando-nos depois a ver o mar, abraçados ou não, conversando ou não.

Vejo as pegadas deixadas pelos diversos veraneantes, turistas e locais, velhos e novos, barrigudos e esculturais, “celulitosos” e secos, morenos, copos de leite ou escaldados, limpos ou tatuados, fatos de banho com a marca berrante a gritar “Vejam como sou cagão” ou descomplexados, com miúdos ou sem eles, de mão dada ou solta,… olho as pegadas na areia que lentamente se desfazem sob as sucessivas vagas e recordo o poema de Margaret Fishback Powers que cantávamos na Igreja de São João e São Pedro, no coro da missa da catequese todos os domingos pelas onze e meia. Cantarolo a versão já meio esquecida, inventando melodia e versos para preencher as partes esbatidas da memória.

Vamos para a toalha secar um pouco, pouco mesmo, dada a força galopante da luz e calor, para nos protegermos debaixo do chapéu a ler, um gosto recente este de ler na praia, A Amiga Genial, o primeiro da série a que finalmente me lancei, e notar em tempo real como é bom estar aqui e agora, a Sofia com o livro dela e eu com o meu, e a praia para nós e para todos os outros.

PARENTESIS: A praia, esse reduto de democracia tão ameaçado, seja pelos concessionários (palhotas a preços de cabrão e a proibição de espetar um chapéu em frente aos cagões, para não lhes estragar a vista mar – podemos estender a toalha, mas chapéu é que não, só ao lado) ou pelo acesso (em São Rafael, nos Salgados e na Comporta tentaram vedar o acesso à praia, o grupo BES, numa usurpação selvagem do espaço público que agora se repete na praia da Galé, não esta onde descanso tranquilamente mas a outra, pouco abaixo da Comporta, com o deboche que por ali vai atacando o acesso por igual a um espaço que deveria ser de todos – o ódio que alguns guardam aos imigrantes, melhor fariam se o despejassem sobre esses cagões que pretendem açambarcar um lugar sobre o qual nunca deveriam ter direito privilegiado de acesso). FIM DE PARENTESIS

Regressamos ao Sul, esse ponto cardeal por excelência a quem raramente perde o Norte e como tal, se perde de amores sempre que consegue esquecer o relógio na gaveta dias a fio ou o problema existencial que é a areia no carro num dia de praia na Costa; o Sul do Verão de Setembro e de Erice, lugar de todas as possibilidades, de todas as leituras e de todos os amores, dos gelados em noites quentes e jantares em esplanadas, experimentar restaurantes e regressar aos (que já são) de sempre, das praias diferentes todos os dias como quem colecciona postais para regressar na última semana àqueles mais valiosos e que apetece repetir.

O Sul, essa maravilha da Geografia que, à escala do Universo perde o sentido, mas que para podermos viver em pleno temos de congregar essas duas realidades, o Universo das grandes forças e buracos negros, das posições relativas, radiação cósmica, anos-luz e uma imensidão de desconhecimento… e a nossa vizinhança, num calhau redondo que nos parece plano, com pontos cardeais e o sol que não é uma estrela mas o que nos aquece e ilumina, e a lua a qual, longe de ser um satélite, é todo um mistério por abraçar. Em férias no Sul, estas impressões ganham cor, fazem-se nítidas, tornam-se tão reais com um contraste mais vivo, os contornos mais definidos, que por duas ou três semanas acreditamos viver num mundo de sonho, o sonho do Sul como no filme do grande realizador espanhol.

A praia sem tempo, um mergulho na água gelada, daquela que enrijece os ossos e paralisa os membros, e secar ao sol, Galé Oeste. E acrescento: uma de muitas definições possíveis de “Paraíso”.

Guia, 5 de Setembro de 2025

 

A Serra

Subimos a serra, cada vez mais inclinada, cada vez mais enevoada, rumo ao miradouro da Fóia, mas desistimos a poucas centenas de metros do almejado lugar, tal a espessa canícula que nos envolvia, pesada, num dia de Setembro que ainda se dizia de Verão.

Sabíamos, pela previsão do dia anterior, que hoje não seria dia de praia na Guia. Entre a caminhada pelo passadiço dos Salgados ou uma ida a Monchique, optámos pela segunda. Um risco calculado sem grande prejuízo, pois em férias, sem outro horário ou compromisso além da vontade do dia, pouco mal nos traria a visibilidade reduzida.

Partimos pelas onze, o tempo a ameaçar, e quanto mais para noroeste, menor a temperatura e a claridade. Conversámos ao sabor das curvas, cada vez menos campo, cada vez mais montanha para, em Monchique colocarmos em causa o miradouro. Insistimos ainda assim, tentando com a vontade dobrar a realidade, que não vergou; também não dispensámos grande esforço para a causa – não valia a pena e reconhecê-lo é uma aprendizagem, estando ou não de férias – e decidimos nesse momento de inversão (passava do meio-dia), almoçar num dos muitos restaurantes de beira de estrada por que havíamos passado à ida.

Tentámos encontrar um miradouro intermédio, que na subida nos pareceu ter uma vista ainda aceitável (encontrava-se a uma altitude muito menor do que a do nosso objectivo), mas demo-lo por perdido. Mais restaurante menos restaurante e caiu o feeling para O Castelo quando vimos o miradouro das Caldas. Sacámos as chapas possíveis e invertemos a marcha novamente, uns poucos de metros rampa acima.

O Castelo, um daqueles lugares de beira de estrada onde comíamos antes de as autoestradas uniformizarem, com as áreas de serviço, todas as nossas refeições em viagem, revelou-se uma experiência muito maior do que o almoço que nos esperava. Estávamos alinhados na vontade de parar num lugar como aquele, fazer da visita a Monchique um sucesso sem coleccionar troféus ou fotos para ejacular com frenesim nas redes sociais. Entremeada, vitela estufada, jarro de tinto da casa a acompanhar, sobremesa – local, pois claro – de alfarroba e limão, e até um medronho com mel, limão e canela para acamar o repasto antes de fecharmos com a bica.

Esperámos um tanto pelo prato, espera essa que, neste cenário, nada nos custou. Uma pintura chamada Laundry Day ou algo assim, retratando mulheres a lavar a roupa no rio, aplicada directamente sobre uma das paredes da sala principal (havia pelo menos mais dois espaços exteriores, cobertos, com as mesas postas para o almoço) assinava de 1990. Há pelo menos trinta e cinco anos que aquele Castelo resiste.

Enquanto aguardávamos, começam a chegar os convivas para um aniversário no espaço exterior – as mesas dispostas em U e dois balões, um 1 e um 0, desfaziam as dúvidas. A dada altura comento com a Sofia Que bebé tão pequeno no colo daquela mulher! e, ante a minha insistência (não muita) ela olha para trás e, acto contínuo, dissolve-me a surpresa Aquilo não é verdadeiro – é um bebé reborn: não vês que nem mexe os braços. Um bebé não mantém assim os braços firmes para cima.

Passei ao ataque: a quanta infantilidade pode um adulto chegar para, juntamente com outros adultos que entretanto chegavam, continuar a segurar um nenuco com os mesmos cuidados com que ampararia um recém-nascido. Que estupidez! comentei, para a Sofia se atravessar logo num dos seus movimentos de compreender o outro Se calhar é da filha e ela está só a segurar. Por mais de cinco minutos?! Naquela posição? Isto é uma idiotice. disse eu, e discorri sobre a infantilidade da gente crescida, não aquela que tomamos como salutar (deixar a vida fluir, abrandar os compromissos, sujar a roupa, saltar das rochas, fazer barulho, chutar a bola, correr, asneirar…) mas uma confusão de papéis a que os mais velhos, talvez fazendo frente a complexos ou recalcamento de outra índole (para permanecerem jovens, recuperarem a juventude, serem bué fixes, estarem sintonizados com os petizes “compreenderem” o jovem, Olhem como a malta nova me curte!…) – se prestam, para serem só ridículos.

Fiquei com a imagem do nenuco aconchegado junto ao peito da cavalona. Não vi crianças por perto, mas pode ser a minha má vontade a destilar o habitual desdém pela gente ridícula. O nenuco e a mãe do boneco saíram de cena para regressarmos à nossa refeição, a verdadeira degustação lusitana, com as toalhas de papel (uma delas substituída depois de a empregada virar as azeitonas sobre nós na primeira tentativa de as trazer para a mesa), a arca com as sobremesas bem visível para uma escolha mais avisada, as garrafas de vinho expostas ao fundo e aquele cheirinho a tradição que, mais do que escrever ou até falar, se sente ao entrar.

Esta ponta de nostalgia, vontade premente de abraçar e manter estas lugares depois de os deixar, como uma saudade antecipada ou um profundo medo de que se percam (vão-se perdendo – já poucos sítios, pelo menos nas grandes cidades, se apresentam assim, verdadeiramente tradicionais e não com o rótulo de “tradicional” que sentimos logo numa ameaça de vómito ser apenas para turista), transforma os lugares, separando o sítio onde almoçámos hoje daquele que aqui relato. São duas realidades que se sobrepõem, aquela onde estivemos fisicamente e aquela que sentimos, não só fisicamente, mas com todos os sentidos e mais os feelings, impressões, lembranças e toda a vida acumulada lá para trás. E no entanto, esta segunda impressão, que é só nossa e que tentamos passar nas palavras que nunca chegam, também é física, também traz algo de comum a todos os que ali comeram hoje ao nosso lado. Uma experiência física e outra metafísica que também é física, numa ligação partilhada com aqueles que, num dado momento do dia ou dos dias anteriores, se decidiram, como nós, a parar ali para almoçar.

Saímos para finalmente descer até às Caldas de Monchique, um lugar abonecado no melhor sentido do termo (não como o boneco nenuco, desfalecido no colo da prima do Peter Pan). Passeámos a pé pela estância termal sob um céu carregado, mas que não ameaçava chuva. E optámos por regressar via Silves, evitando assim a autoestrada e prolongando o dia pelo interior algarvio.

Tudo somado, não passaram mais de quatro horas entre o momento em que saímos de casa, pelas onze, a hora a que estacionámos o carro, mas se o tempo não convida a um dia de praia, convida certamente a outra coisa qualquer. Eu nunca havia ido a Monchique e esta visita convidou-me a uma outra, para finalmente saborear a vista do miradouro da Fóia. O mesmo já nos havia acontecido numa viagem da Pampilhosa ao Piodão, feita sob chuva torrencial: do miradouro Miguel Torga nada virmos, tendo que lá voltar (para comprovar não ser genial ou, o que é mais provável, não estar à altura da expectativa que eu levava). Pouco importa não ter sido do nosso agrado ou tanto do nosso agrado; importa encontrarmos pretextos para fazer com que tenha valido a pena.

Se o dia terminasse agora, 16:56, enquanto escrevo as últimas palavras deste texto depois de bezerrar pelo sofá à procura de um filme na box que não chamou por mim, o “hoje” já valeu a pena. Poderia terminar que aquelas quatro horas teriam sabido pelas vinte e quatro.

Guia, 7 de Setembro de 2025

 

A Vila

A vila pode ser uma das três que formam o triângulo escaleno naquele ponto quase médio do Algarve (ligeiramente descaído para o barlavento), cujos vértices se sentam na perfeição em Armação, Albufeira e Guia, por ordem inversa de preferência. Pouco importa que na sede de concelho soprem ventos de cidade desde 86: seria uma incongruência lógico-matemática um triângulo possuir um vértice mais importante do que os demais, mais ainda quando um ponto é um objecto de dimensão nula.

Em Armação, aborto arquitectónico, paisagístico, praia urbana à sombra de torres encavalitadas umas nas outras (com que sofreguidão o concelho de Silves não almejava ter praia, acesso ao mar e aos euros dos turistas?), fizemos do passeio nocturno uma tradição do sul. O carro invariavelmente estacionado no descampado poente da vila (também deve querer ser cidade não tarda) e a pequena caminhada pelo “calçadão” marítimo, entre prédios e o areal, restaurantes apinhados na primeira semana de Setembro para, mal a escola ameaça abrir (abençoada), a debandada deixar um espaço (e tempo) imenso para nós, que caminhamos com um destino traçado mesmo sem comentar, sem combinar, sabendo que o que o outro quer é o que nós queremos, artistas de rua nas noites quentes do sul aos quais somos mais ou menos indiferentes, de tantos que já vimos, ainda que continuemos a atribuir-lhes a graça de assinarem o nome na história da terra.

Vamos aos gelados, no outro extremo da calçada. Não poucas vezes vociferei contra o Pinguim, uma gelataria que fechava nas alturas mais inacreditáveis – a partir de 10 de Setembro, nos feriados de Junho, etc… – sempre com o papel afixado a anunciar as férias. Estes algarvios não sabem ganhar dinheiro! Depois queixam-se de que ninguém cá põe os pés! e outras coisas piores que se me escapam e não me apetece reproduzir aqui. A irritação vem do facto de os gelados serem mesmo bons. Ou eram: fechou de vez. Bem feito! congratulo-me: a burrice para o negócio não era apenas um desabafo de quem não poucas vezes ficou a salivar; era a verdade que há dias ficou demonstrada quando batemos com o nariz na porta.

Os azares de uns são a sorte de outros: nas vezes em que encontrámos o Pinguim (Nosolo) fechado, não deixámos de satisfazer o desejo. No VitaMilk, setenta metros antes, encontrámos uma satisfação que há muito ultrapassou a compensação pela falta do doce original: Estes gelados ombreiam ou ultrapassam mesmo os outros, que havíamos começado a frequentar a conselho da Filipa. Pelo caminho, ainda experimentámos uma outra marca, cujo nome me escuso de mencionar, além de referir estar sempre com fila no passadiço e ter um letreiro amarelo, mas que redundaram numa grandessíssima merda, com um dos sabores mais salivados – Dom Rodrigo – a dar vontade de cuspir na sopa.

Armação não traz mais do que isto ao tempo de férias dos nossos Verões, mas isto já é muito, na construção de uma pequena tradição onde vamos coleccionando lugares de ano para ano que se fazem habituais.

Na Guia encontro esse espaço mais recatado que me recorda Vila Real de Santo António, Tavira em ponto pequeno (e Vila Real também, se bem que aquela que eu recordo, dos anos oitenta, era um lugar bem pequeno), lugares sem espaço para vaidades e salamaleques, com o mercado e o clube recreativo e desportivo onde abancamos sempre para ver um ou dois jogos de bola e comer petiscos. Nestes cinco anos acompanhámos a subida galopante dos preços (o chouriço assado custava € 5,00 em 2020; em 2025 custa € 9,00!), continuando contudo a compensar pelo bem que nos sabe estar ali, salada de polvo e pica-pau, choco frito e caracóis (não para mim), pão torrado, branco fresquinho e uma fatia de tarde Dom Rodrigo (novamente ele!).

No Ramirez, outro local de romaria obrigatória, as sobremesas são servidas nas doses mais generosas que eu alguma vi num restaurante – numa fatia de torta de alfarroba e laranja vêm duas, gémeas, sem que o preço seja necessariamente a dobrar; também a torta de claras se transforma numa ampliação, como se viesse directamente da mala do Sport Billy, a que o café no final só vem reforçar o sabor. Também lá servem frangos com batatas fritas e salada de tomate; e é bom, mas passar pela vitrine dos doces é mais apetecível e muito menos decadente do que passear pelas montras de Amesterdão.

Depois há a Colibri e os doces do Algarve, a Colibri II onde iniciámos outro hábito, este de almoçar no regresso de uma das praias daquele lado (Galé, Coelha, São Rafael…), uma salada ou uma tosta e claro, uma fatia de bolo de noz ou de torta de claras (a mesma do Ramirez!). Bom e barato, sem enchentes, com simpatia. Tudo o que se quer em férias (e não só).

Outros, não na Guia mas nos arrebaldes, que se foram integrando, com suavidade, nesta nossa forma de viver o sul: Adega dos Salgados, Prima Pasta, Grelha do Ti Manel, Casa do Avô

Albufeira. O lugar para onde migram todas as espécies raras do planeta, também se converteu num local de paragem obrigatória, várias vezes em cada período de veraneio. Dois pontos da vila-cidade foram alargando o buraco do pionés no nosso mapa de parede deste lugar.

A baixa, junto à praia dos pescadores, redunda invariavelmente num passeio por uma feira de aberrações, como a casa do terror da Feira Popular, com pestanas falsas e toneladas de maquilhagem, trajes minimalistas, mesmo quando o vento aperta e álcool a dar-lhes assim para o parvo. As vidas de lá, no ilhéu de onde os autóctones debandam na época do calor, replicadas por aqui: os mesmos pubs, cerveja na mesa, despedidas de solteiro muito estúpidas (!), futebol, rugby ou cricket nos televisores (sem que nós, portugueses tenhamos direito a ver um jogo que nos interesse), karaokes assassinos digladiando-se bar sim bar sim, ano após ano com as mesmíssimas três canções assassinadas nas vozes arrastadas das lagostas bêbedas: Don’t Look Back in Anger, Wonderwall e Angel. Talvez por serem mais fáceis de cantar, talvez por conter os selvagens na jaula dos 90s, quando se lembravam de ser gente.

Na baixa, atravessámos a chinfrineira sem que nos consigamos ouvir: concertos, bares, gritos, vendedores de toda a espécie: quinquilharia que nas últimas décadas pulula por todo o lado, bem como vendedores de umas lanternas que voam, e que eles lançam para o ar, caindo depois lentamente, coloridas, sem que eu alguma vez tenha descoberto a razão de ser daquela merda. Ao cruzar a Central Station, entramos no largo onde se encontra a nossa gelataria de eleição, espaço de qualidade no meio da Twilight Zone, um oásis: Saylor Ice Cream! É ali que as vozes se calam e o mundo pára, intervalo ansiolítico bem no núcleo do hospício para degustar com prazer o Biscoff, Caramelo Salgado, Oreo, … há dias, na última visita, o rapaz dos gelados reconheceu-me, tal não é a frequência (e a satisfação) sempre que o vemos!

A zona alta traz-nos a outra tradição de Albufeira: na Riviera, as fatias de bolo são fatiões, exemplares ciclópicos onde quase tudo vem em doses generosas: das dimensões ao açúcar, passando pelo sabor, reflexo da qualidade dos produtos; só o preço se mantém algo liliputiano, uma surpresa num lugar daqueles, pelo menos tendo em conta a expectativa. A Floresta Negra (chocolate, creme de ginja e chantilly) foi o primeiro colosso que dali trouxemos. Seguiram-se outros, Floresta Branca, o Bolo de Coco, o de Amêndoa Caramelizada com creme, e alguns mais que estão na calha para provar (Noz com Doce de Ovo, o de Chocolate, etc…). Entrar na Riviera é voltar à infância, esse lugar onde tudo é perdoado e quase tudo é permitido, é abusar e lambusar porque são férias e convencemo-nos de que “é só nas férias”, de que temos direito depois de um difícil ano de trabalho, como se o corpo percebesse e nos dissesse Está bem, como estás de férias, podes entupir as veias de açúcar que não faz mal porque eu compreendo-te e neste período, até alargo um pouco os vasos sanguíneos para que a glicémia não rebente pelos poros.

Terminado o périplo, fechámos o triângulo, praticamente isósceles, como se a Guia, vértice oposto ao lado mais longo, formasse o ponto mais importante deste trio. Afinal, talvez exista um ponto maior que os demais, uma estrela no mapa da nossa bezerrice, não uma estrela Michelin, mas mais brilhante, saborosa e sem dúvida, mais sintonizada com a disposição do momento. São assim as férias de Verão na vila.

Guia, 9 de Setembro de 2025


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